UM EM CADA TRÊS MEMBROS DA CPI DO CACHOEIRA JÁ FOI ALVO DE DENÚNCIAS
Marco Antonio VILLA
O Brasil é um país, no mínimo, estranho. Em 1992, depois de grande mobilização nacional e de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) acompanhada diariamente pela população, o então presidente Fernando Collor de Mello teve o seu mandato cassado. Foi o primeiro presidente da República que teve aprovado um processo de impeachment no País. De acordo com os congressistas, o presidente foi deposto por ter cometidos crimes de responsabilidade. Collor foi acusado de ter articulado com o seu antigo tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, um grande esquema de corrupção que teria arrecado mais de US$ 1 bilhão. Acabou absolvido pelo Supremo Tribunal Federal por falta de provas. Passados 20 anos, o mesmo Fernando Collor, agora como senador por Alagoas, foi indicado por seu partido, o PTB, para compor a CPMI que se propõe a investigar as ações de Carlinhos Cachoeira. DEIXOU A POSIÇÃO DE CAÇA E PASSOU A SER UM DOS CAÇADORES. Quem mudou: COLLOR ou o BRASIL? Provavelmente nenhum dos dois. Algo está profundamente errado quando um país não consegue, depois de duas décadas, enfrentar a corrupção. HOJE, DIFERENTEMENTE DE 1992, AS DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO SÃO MUITO MAIS GRAVES. Estão nas entranhas do Estado, em todos os níveis, e em todos os Poderes. Não se trata - o que já era grave - simplesmente de um esquema de corrupção organizado por um grupo marginal do poder, recém-chegado ao primeiro plano da política nacional. Ao longo dos anos a corrupção foi sendo aperfeiçoada. Até adquiriu status de algo natural, quase que indispensável para governar. Como cabe tudo na definição de presidencialismo de coalizão, não deve causar admiração considerar que a corrupção é indispensável para a governabilidade, garante estabilidade, permite até que o País possa crescer - poderia dizer algum analista de ocasião, da turma das Polianas que infestam o Brasil. Parodiando Karl Marx, CORRUPTOS DE TODO O BRASIL, UNI-VOS! Essa poderia ser a consigna de algum partido já existente ou a ser fundado. Afinal, a nossa democracia está em crise, mas não é por falta de partidos. É uma constatação óbvia de que o Brasil não tem memória. O jornalista Ivan Lessa escreveu que a cada 15 anos o Brasil esquecia o que tinha acontecido nos últimos 15. Lessa é um otimista incorrigível. O esquecimento é muito - mas muito - mais rápido. É A CADA 15 DIAS. Caso contrário não seria possível imaginar que Fernando Collor estivesse no Senado, presidisse comissões e até indicasse diretores de empresas estatais, como no caso da BR Distribuidora. E mais: que fosse indicado como membro permanente de uma CPMI que visa a apurar atos de corrupção. Indo por esse caminho, não vai causar nenhuma estranheza se o Congresso Nacional revogar o impeachment de 1992 e até fizer uma sessão de desagravo ao ex-presidente. Como estamos no Brasil, é bom não duvidar dessa possibilidade. Em 1992 muitos imaginavam que o Brasil poderia ser passado a limpo. Ocorreram inúmeros atos públicos, passeatas; manifestos foram redigidos exigindo ética na política. Até surgiu uma "GERAÇÃO DE CARAS-PINTADAS". Parecia - só parecia - que, após a promulgação da Constituição de 1988 e a primeira eleição direta presidencial - depois de 29 anos -, a tríade estava completa com a queda do presidente acusado de sérios desvios antirrepublicanos. O novo Brasil estaria nascendo e a corrupção, vista como intrínseca à política brasileira, seria considerada algo do passado. Não é necessário fazer nenhum balanço exaustivo para constatar o óbvio. A derrota - de goleada - DOS VALORES ÉTICOS E MORAIS REPUBLICANOS FOI ACACHAPANTE. Nos últimos 20 anos tivemos inúmeras CPIs. Ficamos indignados ouvindo depoimentos em Brasília com confissões públicas de corrupção. Um publicitário, Duda Mendonça, chegou mesmo a confessar - sem que lhe tivesse sido perguntado - na CPMI do Mensalão que havia recebido numa conta no exterior o pagamento pelos serviços prestados à campanha do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva. A bombástica revelação foi recebida por alguns até com naturalidade. O que configurava um crime de responsabilidade, de acordo com a Constituição, além de outros delitos, não gerou, por consequência, nenhum efeito. E, vale recordar, COM A CONCORDÂNCIA BOVINA - para lembrar Nelson Rodrigues - DA OPOSIÇÃO. A aceitação de que política é assim mesmo foi levando à desmoralização da democracia e de seus fundamentos. HOJE VIVEMOS UM SIMULACRO DE DEMOCRACIA. NINGUÉM QUER FALAR QUE O REI ESTÁ NU. DEMOCRACIA VIROU SIMPLESMENTE SINÔNIMO DE REALIZAÇÃO DE ELEIÇÕES, DESPOLITIZADAS, DESINTERESSADAS E COM UM CONSIDERÁVEL ÍNDICE DE ABSTENÇÃO (MESMO COM O VOTO OBRIGATÓRIO). AQUI, ATÉ AS ELEIÇÕES ACABARAM POSSIBILITANDO EXPANDIR A CORRUPÇÃO. Na política tradicional, a bandeira da ética é empunhada de forma oportunista, de um grupo contra o outro. Na próxima CPI os papéis podem estar invertidos, sem nenhum problema. É um querendo "PEGAR" o outro. E muitas vezes o feitiço pode virar contra o feiticeiro. E AS CONDENAÇÕES? Quem está cumprindo pena? Quem teve os bens, obtidos ilegalmente, confiscados? NADA. O que vale é o espetáculo, e não o resultado. O Brasil conseguiu um verdadeiro milagre: descolou a política da economia. O País continua caminhando, com velocidade reduzida, por causa da má gestão política. Mas vai avançando. E por iniciativa dos simples cidadãos que desenvolvem seus negócios e constroem dignamente sua vida. Depois, muito depois, vão chegar o Estado e sua burocracia. Aparentemente para ajudar, mas, como de hábito, para tirar "ALGUMA CASQUINHA", para dizer o mínimo. E a vida segue. Não vai causar admiração se, em 2032, DEMÓSTENES TORRES for indicado pelo seu partido para fazer parte de uma CPI para apurar denúncias de corrupção. É o meu Brasil brasileiro, terra de samba e pandeiro... (As manchetes e a imagem não fazem partes do texto original).
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