terça-feira, 1 de outubro de 2013

ESTÁ CHEGANDO A HORA: “AFINAL, A ÉTICA É A BASE DA SUSTENTABILIDADE”.

  



OFICINA VAZIA



Marina Silva


Na varanda do quintal, tenho a pequena oficina em que faço minhas joias, com sementes que os amigos trazem da floresta. Em silencioso trabalho, vou polindo também pensamentos, palavras, sentimentos e decisões. Nas vésperas de grandes momentos da política de que participo, encontro nesse trabalho inspiração e calma. Comparo-o à gravidez, quando precisamos de tranquilidade em meio a grandes esforços. Às vezes, não há tempo para o artesanato, apenas o breve olhar saudoso para a oficina ao sair na pressa de viagens e reuniões. Resta o consolo do caderno onde desenho, num avião ou numa sala de espera, colares que um dia fabricarei. Em dias mais agitados, nem mesmo o caderno. O tempo é semente preciosa e rara. Mas consegui --em madrugadas de oração-- ver que há, instalado na alma, um dispositivo da fé que nos dá "CALMA NO OLHO DO FURACÃO" e a esperança de que tudo sairá conforme uma vontade superior à nossa. Essa conformidade exige condições. A primeira é a consciência tranquila de ter feito tudo o que estava em nossa capacidade de acreditar criando, não só cumprindo as regras, mas dedicando alma e coração. Numa régua nos medimos. O CHEFE DO GOVERNO SABE SE FAZ TUDO PELO DIREITO REPUBLICANO DOS CIDADÃOS OU SÓ PROPAGANDA PARA MANTER O PODER. O LÍDER DA OPOSIÇÃO SABE SE DEFENDE O BEM DO PAÍS OU TORCE POR ERROS DO GOVERNO PARA TIRAR VOTOS. O EMPRESÁRIO SABE SE PRODUZ RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL OU SÓ TRANSFORMA PREJUÍZO PÚBLICO EM LUCRO PRIVADO. O MAGISTRADO SABE SE BUSCA JUSTIÇA OU FORMALIDADES QUE CONDENAM INOCENTES E ABSOLVEM CULPADOS. POR ISSO, A ÉTICA É BASE DA SUSTENTABILIDADE, espaço público e íntimo em que cada um encontra sua verdade e a segue ou a trai, ocultando-a sob uma consciência opaca. Agora, revendo anotações para um artigo, acho desenhos e poemas em velhas páginas. Ergo os olhos para a oficina vazia. Nada lamento. Versos feitos noutro tempo de difícil transição política voltam hoje, quando espero justiça de mãos dadas com milhares de idealistas que superam boicotes e empecilhos para dar ao Brasil chance de uma nova escolha. Possa a poesia, que o tempo há de polir, encher o espaço entre esperança e realidade: Sei não ser a firme voz que clama no deserto/ Mas estou perto para expandir seu eco/ Sei não ter coragem de morrer pelos amigos,/ Mas guardo-os em recôndito abrigo/ Sei não ter a doce força de amar inimigos,/ Mas não me vingo ou imponho castigo/ Sei não ser sempre aceito o fruto de minha ação/ Mas o exponho ao crivo d'outra razão. Voz, coragem, força, aceitação/ Tem fonte no mesmo espírito/ Origem no mesmo verbo/ Lugar onde me inspiro/ E a semelhança preservo/ Na comunhão com meu próximo/ No Logos que em mim carrego.

 

 

 

 

 


 

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