segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

NA LAMA COM LULA



Guilherme Fiuza

Não adianta. O Brasil jamais sairá dessa lama enquanto continuar descuidando de suas tragédias reais para discutir, a toda hora, por que criminoso condenado e preso não pode andar por aí como todo mundo. O país está enguiçado no fantasma de Lula.

O pedido da defesa do ex-presidente para que ele fosse autorizado a comparecer ao velório do irmão foi inicialmente negado, após parecer da Polícia Federal. Depois o presidente do STF, cria do PT, deu a autorização – desde que Lula não fizesse pronunciamentos públicos e se encontrasse com os familiares reservadamente. A essa altura o enterro já havia ocorrido e o ex-presidente resolveu não ir a São Bernardo.

É uma desumanidade, reagiu um bom pedaço do Brasil – incluindo muitos críticos de Lula, aproveitando a oportunidade para mostrar que têm coração.

Não há dúvida: no peito dos distraídos também bate um coração, o mesmo ocorrendo com os hipócritas. Mas se é para falar em desumanidade, vamos nos transportar por um breve instante para os idos de abril de 2018 – passado remoto do qual ninguém se lembra mais.

Naquele momento da pré-história, quando Lula livre ainda não era só um slogan mofado na parede dos picaretas, deu-se a selvageria. Com sua prisão decretada pelo juiz Sergio Moro – após condenação confirmada em tribunal federal por corrupção – o ex-presidente perseguido, injustiçado e milionário disse à Justiça e ao país o seguinte, através de sua militância: estou preso? Então venham me prender.

Ele já tinha feito isso – de viva voz – alguns meses antes, em recado direto a Sergio Moro. Avisara que, se quisessem prendê-lo, era bom andarem logo, porque senão era ele quem iria prendê-los. Aquele jeitinho peculiar de excitar as bases para recolocá-lo no poder e devolver-lhe o condão de barbarizar acima das leis. Se as bravatas tinham funcionado por décadas, não seria agora que iriam falhar.

Nesse embalo democrático, republicano e cheio de espírito humanitário, Lula se aquartelou num sindicato em São Bernardo cercado por uma tropa de boçais distribuindo sopapos em jornalistas e mandando um recado gentil aos guardiões do estado de direito: o chefe só sai daqui sobre os nossos cadáveres.

Foi assim que essa pobre vítima da desumanidade nacional cuspiu na Justiça, zombou de uma ordem de prisão e avisou que iria combater a lei na base da porrada.

Mais uma vez, Lula estava fazendo o que fez a vida inteira: investir no conflito, se colocar na mira de carrascos imaginários a serviço da elite branca, instigar os incautos a odiar alguém “do outro lado”, enfim, encenar a ópera bufa do coitado profissional. E, claro, provocar em todos os que percebem sua encenação uma ira de mesma intensidade e sentido contrário. Daí o clamor para que Sergio Moro mandasse a polícia invadir o sindicato e prender o meliante desafiador.

Moro não fez isso e chegou a ser chamado de covarde por muita gente.

O juiz não só não se perturbou com os insultos, como ainda esperou Lula discursar num “SHOWMISSA” – assim chamado pelos próprios organizadores, com transmissão internacional ao vivo – alegadamente em homenagem à esposa falecida, a quem o próprio Lula já havia culpado por delitos que estava sendo acusado de cometer. Uma senhora homenagem póstuma desse grande ser humano.

O ex-presidente e líder do maior assalto da história só desistiu do teatro quando entendeu que Sergio Moro não ia lhe dar o banho de sangue tão bem preparado. E que essa afronta explícita à Justiça ia lhe sair caro.

Pois saiu barato. Menos de um ano depois, um exército de almas boas considera desumano não dar a Lula nova chance de montar seu circo de horrores e chantagear as instituições.

Enquanto solidariedade e leviandade estiverem misturadas na mesma massaroca de valores, o Brasil não sai dessa lama.

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