Urnas repletas de votos já preenchidos – adivinhem em favor de quem – foram fotografadas a caminho de seu destino fraudulento.
Em algumas seções, Evo Morales teve 100% dos votos, mais do que os líderes soviéticos no auge do poder.
Infamemente, o Tribunal Eleitoral interrompeu a contagem quando 83% dos votos haviam sido apurados e estatisticamente comprovavam: Evo Morales venceria, mas iria a segundo turno contra Carlos Camacho.
Quando a apuração foi retomada, todo mundo sabe o que aconteceu. Evo achou que, espertamente, tinha garantido, fraudulentamente, a vitória já no primeiro turno – eliminando a hipótese de perder no segundo.
Acabou renunciando.
Todas as irregularidades mencionadas acima aconteceram antes que a Organização dos Estados Americanos apresentasse seu relatório com uma análise mais profunda da operação fraudulenta em toda sua dimensão, sendo a mais escandalosa a transferência dos dados para um servidor externo. Tipo um fantasma digital com o dom de alterar o resultado.
Como a diferença necessária para dar menos de 10%, eliminando assim o segundo turno, era de algumas dezenas de milhares de votos, não foi exatamente difícil.
Chamar a OEA de golpista e atribuir a ela, via Estados Unidos e seus aliados entre países governados pela direita, Brasil incluído, propósitos malignos faz parte do chororô, mas não dos fatos.
Em circunstâncias diferentes, o uruguaio Luis Almagro teria uma atuação muito menos visada – e também mais discreta, Mas ainda não obteve o dom de derrubar governos, mesmo que queira.
Evo Morales renunciou em condições evidentemente anômalas: a polícia se amotinou, anunciando que não ia reprimir manifestações populares, O recado do general Williams Kaliman, de que era melhor renunciar para restaurar a paz social fechou a conta.
Como curiosidade de pé de página da história: Kaliman vivia elogiando Evo, inclusive para desgosto de outros comandantes militares.
Chegou a chamá-lo de “presidente favorito” por seus oficiais pelo afagos – e verbas – dirigidos mas Forças Armadas.
Evo imaginava que isso, mais a “refundação”, a doutrinação, os bônus e sabe-se lá que favores clandestinos infames no país da coca lhe garantiam a conivência dos quartéis. Enganou-se.
Pode ser chamado de golpe o que aconteceu não Bolívia? Tecnicamente, sim.
Se o poder armado “aconselha” a renúncia, em meio a manifestações cada vez mais exaltadas, o presidente deixa de ter a garantia de proteção pelos detentores do uso da força.
Também pode ser argumentado, e bem argumentado, que num momento gravíssimo, em que a paz social ia para o buraco, levando o país junto, os comandos militares interferiram in extremis.
O que vai acontecer a partir de agora estabelecerá se foi um golpe clássico ou não. Se voltarem para os quartéis, depois de convocadas, realizadas e chanceladas eleições, não foi.
Se ficarem no Palácio Queimado, queimam-se as chances de uma revitalização democrática.
Na Bolívia, os ânimos estão quentes, com saques e incêndios de casas de figurões do governo, inclusive de Evo Morales.
Pode ser um aspecto da justiça popular, favorecida por ele quando implementou legislação abrindo caminho à “justiça tradicional”.
Tradução: linchamentos decididos por tribunais populares segundo a antiga tradição dos povos indígenas.
De qualquer maneira, os abusos precisam ser controlados. Os bolivianos merecem coisa melhor.
Escreveu um leitor anônimo no El País, tentando explicar o que estava acontecendo, um pouco antes da renúncia:
“Todos os bolivianos, todo o povo da Bolívia, como talvez nunca na história, os jovens que só conheceram este presidente, os povos indígenas da Amazônia e dos Andes, as mulheres, os ricos e os pobres, os mineiros e os médicos não querem mais o tirano.”
Atribuir um momento assim a manipulações da OEA e conspirações da direita é de uma pobreza intelectual que não só diminui a bravura e os anseios dos bolivianos, como indica uma triste regressão de uma esquerda que perdeu a capacidade de análise e de autocrítica. E, mais triste ainda, resolveu se aliar com tiranetes. - Texto gentilmente roubado lá do Blog de Orlando Tambosi - A manchete e a imagem não fazem parte do texto original -
Um comentário:
O pior de tudo, Guerrilheiro, é que ainda tá cheio de gente que votaria no Seboso; inclusive muitos professores com quem dou aula. Se o Nove-dedos puder se candidatar na próxima eleição, não tenho dúvidas que ele seja eleito, não.
Postar um comentário