Arnaldo Jabor
Chega de política. Vou falar de sexo.
Antes, havia a "SEXPOL", bandeira da política sexual dos anos 60.
Hoje, temos no máximo a "POLSEX", ou seja, como as ideologias
dançaram, só a sexualidade explica os rumos do mundo e, claro, do Brasil, nosso
grande motel das ilusões perdidas. Sexo: nossos sentimentos estão canalizados
para um mesmo buraco. Ando pela rua e todos os outdoors são de mulher nua -
outro dia, quase bati o carro na Av. Paulista, por causa da loirinha nua da
Playboy. Todas as capas de revista são uma grande feira de mulheres gostosas e
homens raspadinhos. Tudo parece liberdade, mas a coisa é outra. Nos anos 60
(oh... os recentes anos remotos) o sexo era uma novidade política, depois dos
caretíssimos anos 1950, quando o sexo tinha algo de crime, algo de secreto que
perfumava nossas vidas com o estímulo da culpa. NÃO HAVIA MOTÉIS, NEM AS PÍLULAS QUE,
DEPOIS, FIZERAM MAIS PELA LIBERDADE SEXUAL QUE MIL LIVROS FEMINISTAS. NUNCA VI
TANTA PUBLICIDADE MOVIDA A SEXO. A propaganda nos promete uma suruba
transcendental. Em nenhum lugar do mundo vemos o apelo sexual nas ruas, nas
roupas de meninas - nosso feminismo resultou na revolução das periguetes. No
Brasil das celebridades, o feminismo foi um mal entendido. Muitas vezes rima
com galinhagem ou até com uma forma velada de prostituição. É uma mistura de
liberdade com submissão à uma salada de frutas: mulher melancia, mulher melão,
mulher jaca. Hoje em dia, as mulheres foram expulsas de seus ninhos de
procriação, de sua sexualidade expectante e são obrigadas ao sexo ativo e
masculino. A "SUPERGOSTOSA" é homem; ou melhor, é produto do desejo masculino. O homem é
pornográfico; a mulher é amorosa. A pornografia é só para homens. Já expuseram
o corpo todo, seios, vagina, mucosas, ânus. O que falta? Os órgãos internos?
Seu ideal é serem desejadas como bons produtos. Felicidade é serem consumidas.
Felizes como coisas: Uma salsicha é feliz? Um bela lata de caviar? Mas, como
amar um eletrodoméstico? A grande moda do momento são mulheres penduradas em
acrobáticas posições ginecológicas para raspar os pelos pubianos nos salões de
beleza. Ficam balançando em paus de arara e, depois, saem felizes com um
jardinzinho estreito e não mais a floresta peluda onde mora a temível "VAGINA DENTADA". Parecem uns bigodinhos verticais que me fazem pensar em Hitler. Que
querem essas mulheres? Querem acabar com nossos lares? Querem nos humilhar com
sua beleza inconquistável? Elas têm de fingir que não são reais, pois ninguém
mais quer ser 'real' hoje em dia. NOS ANOS 60, SEXO ERA REVOLUÇÃO POLÍTICA. TUDO ERA POLÍTICO. O
SEXO UTÓPICO DOS ANOS 60 ERA O PRELÚDIO PARA OUTRAS CONQUISTAS SOCIAIS. O orgasmo para Reich era uma vitória contra a burguesia. Eu me lembro de
ter dito para uma mulher amada: "QUERIDA, NOSSO AMOR É UMA FORMA DE LUTA
CONTRA O IMPERIALISMO NORTE AMERICANO." O sexo dos 60 era um comício;
queria acabar com a culpa, com o limite, com o proibido. Todas as sacanagens
foram testadas, mas chegou-se ao outro lado com uma vaga insatisfação. O que
faltava? Faltava o pecado. Sem o pecado ficávamos insuportavelmente livres. Em
meio a tanta liberdade, nunca fomos tão solitários. Tudo era referido ao sexo,
para substituir frustrações políticas e sociais. Com a re-caretização do mundo,
a liberdade aparente conquistada andou para trás . A liberdade deu lugar a "DESSUBLIMAÇÃO
REPRESSIVA," como nomeou Marcuse, uma "LIBERDADE" tão ostensiva
e grossa que é um louvor à proibição. Os sonhos viraram produto. Todas as
conquistas viraram fetiches de consumo: revolta, igualdade, utopias, até o
desespero e a angustia passaram a vender roupas e costumes. O prazer é
obrigatório no mercado. A partir dessa época, sob a aparência de grandes
euforias narcisistas de gestos e risos de prazer, há um regressismo oculto no
mundo de bundas e coxas lipoaspiradas, seios siliconados, bofes comedores. A
anatomia virou uma das poucas portas de fuga da classe baixa, como uma saída
para a miséria. Nuas, todas as mulheres são iguais: A DEMOCRACIA DA BUNDA. A BUNDA É A
ESPERANÇA DE MILHARES DE CINDERELAS. A mídia e a propaganda
compraram a liberdade, que não é mais "uma calça velha e desbotada,"
mas é a superação do pudor, da intimidade. Se alguma mulher ficar famosa, tem
de tirar a roupa. O strip-tease é a 'anti-burka' - igual pelo avesso. A pessoa
não tem mais um corpo; o corpo é que tem uma pessoa, frágil, tênue, morando
dentro dele. O corpo e a pessoa são duas coisas diferentes; A MENINA MOSTRA SUA BUNDA COMO SE FOSSE
UMA IRMÃ SIAMESA. Tanta oferta sexual angustia-nos,
dá-nos dá a certeza de que nosso desejo é programado por indústrias
masturbatórias, provocando tesão para vender satisfação. A verdade é que o
prazer anda de cabeça baixa, deprimido, apesar do eufórico exibicionismo em
revistas de celebridades. Todos podem confessar tudo: "SIM, EU GOSTO DE ATACAR NOS
MICTÓRIOS DAS RODOVIÁRIAS E ME ORGULHO DE MINHA TARA!" - DIZ O PERVERSO
SORRINDO NA TV. A permissividade total esvai a
tesão. O prazer precisa da proibição. Aliás, o vício solitário é bem seguro. A PUNHETA É
METAFÍSICA. A MASTURBAÇÃO A DOIS EXISTE ATÉ NO GRANDE AMOR ROMÂNTICO, ONDE DOIS
NARCISISMOS SE TOCAM, SE BEIJAM, SE ARRANHAM, MAS NÃO SE COMUNICAM. NINGUÉM
MAIS QUER SER 'SUJEITO', APESAR DE AFIRMAR O CONTRÁRIO. TODOS QUEREM SER
"INCONFORMISTAS COMO TODO MUNDO." O corpo tem de dar
lucro. Todo mundo quer ser coisa. Vi um anúncio de uma boneca inflável que
sintetizava o desejo secreto do homem de mercado: ter mulheres digitais que não
vivam. O anúncio tinha o slogan em baixo: "She needs no food nor stupid
conversation" ("NÃO
PRECISA DE COMIDA NEM DE CONVERSA FIADA"). A liberdade de mercado
produziu um estranho “mercado da liberdade” (A manchete e a imagem não fazem
parte do texto original).
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