Carlos Brickmann
Não consegui ouvir direito a
frase que motivou o afastamento de William Waack da Rede Globo de Televisão.
Mas minha eventual incapacidade auditiva, e a de vários colegas que também
tentaram ouvi-la sem êxito, não entra na discussão: admitamos que Waack tenha
mesmo dito que as buzinadas na rua, que atrapalharam a gravação de seu programa
e o irritaram, eram “coisas de preto”.
Mas, como minha surdez, a
frase de Waack não tem nada a ver com o caso. A campanha contra ele, um ano
depois da gravação da frase, não tem como motivo algo que tenha dito, mas o
fato de ter sido dito por ele. Não é a injúria racial, ou racismo, o motivador
da campanha: é o pensamento de Waack, que desagrada militantes de tendências
opostas.
Imaginemos que, em vez de
Waack, outras pessoas, de outras tendências político-partidárias, tivessem
pronunciado frases do mesmo teor. Melhor, em vez de imaginar, lembremos frases
já enunciadas por pessoas tão ou mais influentes que William Waack:
Do presidente Ernesto Geisel,
referindo-se a um economista liberal (e, portanto, adversário de sua política
econômica), professor Eugênio Gudin: “Esse judeu filho da puta!” O episódio é
narrado na excelente obra de Elio Gaspari sobre o regime militar. Alguém
protestou contra a frase preconceituosa de Geisel? OK, era perigoso falar mal
de Geisel durante a ditadura. Mas nas dezenas de anos que se passaram, e com o
caso voltando ao debate com os livros de Gaspari, houve protestos? A propósito,
o professor Gudin não era judeu.
Do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva para o prefeito de Pelotas, RS: “Pelotas é um pólo exportador de
veados”. Homofobia? Ninguém chegou a falar nisso, que me lembre. Ah, se Waack
fosse o autor da frase! …cá entre nós, quem nunca fez
piada de português, de loira burra, de preto, de judeu, de turco, de veado, de
sapatão? Apresente-se…
Do governador paulista Orestes
Quércia, brincando ao telefone com o prefeito de Pelotas (que ficou furioso):
“Podemos fazer uma estrada ligando Campinas a Pelotas, a Transviadônica”.
E há, é óbvio, o caso de
Caetano Veloso. Paula Lavigne disse que, aos 13 anos, foi à festa de
aniversário de Caetano, que fazia 40, com a intenção (bem sucedida) de fazer
sexo com ele. Agora, na mesma guerra ideológica que tenta vitimar Waack, mas
com sinal partidário trocado, quiseram atribuir a Caetano o crime de pedofilia,
como querem atribuir a Waack o de racismo. E, semelhante em ambos os casos, há
a má intenção de atingir uma pessoa de quem não gostam usando pretextos
politicamente corretos.
E, cá entre nós, quem nunca
fez piada de português, de loira burra, de preto, de judeu, de turco, de veado,
de sapatão? Apresente-se. E atire a primeira pedra.
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