terça-feira, 16 de abril de 2019

A SUPREMA CENSURA À IMPRENSA



Felipe Moura Brasil
Dias Toffoli tem o hábito de atacar quem desconfia da natureza política de suas decisões ou publica fatos negativos a seu respeito.
Em 2015, sobre quem acha que ele tem uma dívida com o PT por ter sido nomeado por Lula para o STF, Toffoli disse à Veja que “é só um ignorante, um imbecil, um burro, um néscio para pensar dessa forma”.
Nos anos seguintes, entre outras decisões, ele mandou soltar o ex-ministro petista Paulo Bernardo, pulando duas instâncias; votou duas vezes pela soltura de seu ex-chefe na Casa Civil do governo Lula José Dirceu, quando estava em prisão preventiva e quando já condenado em segunda instância; votou contra a prisão em segunda instância dois meses após Lula ter sido indiciado pela Polícia Federal no caso do triplex; votou pela concessão de habeas corpus a Lula e ao ex-ministro petista Antonio Palocci; votou para tirar do então juiz Sergio Moro as menções da delação da Odebrecht a Lula que tratam do sítio de Atibaia e do Instituto Lula; e votou pela anulação de provas contra o casal petista Gleisi Hoffmann e Paulo Bernardo na Operação Custo Brasil.
Na última sexta-feira, o ministro Alexandre de Moraes determinou uma censura de reportagem, após Toffoli autorizar, dentro de inquérito genérico que ele próprio havia criado contra supostos ataques ao Supremo, “a devida apuração das mentiras recém divulgadas por pessoas e sites ignóbeis que querem atingir as instituições brasileiras”.
Os sites que o atual presidente do STF xinga de “ignóbeis” são O Antagonista e sua criação, a revista Crusoé, que publicou a matéria com um documento segundo o qual Marcelo Odebrecht chamava Toffoli de “amigo do amigo de meu pai”, ou seja: amigo de Lula, o amigo de Emílio Odebrecht.
As pessoas que o atual presidente do STF xinga de “ignóbeis” são os repórteres e editores da Crusoé, que divulgaram um documento com a explicação do empreiteiro sobre o codinome de Toffoli – documento que, um dia após a reportagem, foi retirado dos autos da Lava Jato por despacho do juiz da 13ª Vara Federal em Curitiba. Como o inquérito está sob sigilo, os motivos para a retirada não ficaram claros.
O que ficou claro é que Toffoli, um dos onze ministros do STF, tenta fazer uma informação comprometedora a seu respeito parecer um ataque as instituições brasileiras, quando nem sequer se trata de um ataque a ele, muito menos ao Supremo; mas sim da vigilância do jornalismo independente sobre as sombras em que eventualmente atuam autoridades e empresários remunerados direta ou indiretamente com dinheiro público.
Como se não bastasse Moraes ter multado a Crusoé, mesmo após a revista cumprir sua determinação para que a matéria fosse retirada do ar, Toffoli ainda disse à Folha de S. Paulo que as “insinuações” da Crusoé sobre ele são “inverdades”. O atual presidente do STF, no entanto, não explicitou a quais insinuações ou inverdades se refere.
Encobrir fatos específicos com generalidades, rotulando tudo e todos que trazem à tona informações incômodas, tem sido expediente comum entre pessoas citadas na Lava Jato, algumas das quais depois são consideradas culpadas e recebem condenação da Justiça.
O padrão retórico de Toffoli, portanto, só traz mais desconfiança sobre a natureza de suas decisões judiciais e curiosidade sobre a documentação que elas buscam enterrar. Com a censura, Moraes ampliou a divulgação de uma reportagem antes pouco repercutida em veículos concorrentes, agora unidos em defesa da liberdade de imprensa.
Se no próprio STF essa defesa prevalecer à cumplicidade corporativista dos demais ministros com a ditadura de toga, o recurso da Crusoé contra a decisão será a maior vitória da história recente brasileira sobre o abuso – “burro” e “ignóbil” – de poder.

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