Tito Guarnieri
Há certas estatísticas das quais se deve desconfiar. Mas elas ganham foro de verdade, se divulgadas por um ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso. Em evento de março, em Londres, ele revelou que o Brasil, tendo apenas 3% da população mundial, concentra 98% das ações trabalhistas do planeta. É estarrecedor. Já sabíamos que a cada ano três milhões de trabalhadores brasileiros ingressam com novas ações nos juizados trabalhistas do país.
Há alguma coisa de irremediavelmente distorcido nesse dado. Se você perguntar a um procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) a causa de tantas ações, ele terá a resposta na ponta da língua: a culpa é dos patrões, que não cumprem as obrigações trabalhistas. Não, definitivamente isso não explica tudo e nem é tão simples. Patrões no Brasil e no mundo querem pagar o menor salário e o menos possível de encargos sociais. Na exata e mesma medida que trabalhadores querem ganhar o máximo, trabalhando o mínimo.
Há um conjunto de razões particulares, só existentes no Brasil, que provocam a distorção. As leis brasileiras são extensas e enroladas. A legislação trabalhista, mais do que as outras, é um cipoal de leis e regulações exaustivas, detalhistas e de alta complexidade. É tarefa de Sísifo cumpri-las integralmente.
Mas a causa principal está em que o Ministério Público do Trabalho e os juízes atuam sob a "jurisprudência" única de que o trabalhador é a parte fraca da relação de emprego, e de que a Justiça do Trabalho é uma forma de fazer justiça social e distribuir a renda. Isto é, na dúvida, os juízes, na sua esmagadora maioria, com o apoio ativo do MPT, decidem a favor do empregado.
Os trabalhadores, que não são bobos nem nada, já notaram faz tempo que entrar com uma ação na Justiça do Trabalho é quase certeza de levar algum dinheiro. E aos magotes propõem ações na Justiça do Trabalho, estimulados e subsidiados pelos advogados dos sindicatos (lembrando que o Brasil é também recordista mundial de número de sindicatos, mais de 15 mil em todo o país), e dos grandes escritórios de advocacia trabalhista que pululam nas cercanias dos juizados.
Juízes, promotores do MPT, altos funcionários da Justiça especializada, sindicatos (e seus advogados), e grandes escritórios de advocacia trabalhista, eis os felizes ganhadores desse jogo de cartas marcadas. Ficam com o grosso dos recursos que giram em torno dos juizados e dos tribunais do trabalho, uns porque recebem salários dentre os mais elevados do serviço público federal, outros, como advogados dos sindicatos e dos grandes escritórios, reservam para si parcelas que podem chegar a 30% do valor das ações.
O trabalhador, ele mesmo, é o primo pobre do sistema. Quando vencem as ações, ou aderem a acordos, recebem apenas uma parte do que lhes pertence.
Não é por outra razão que a maior resistência a uma reforma trabalhista venha exatamente deles, MPT, juízes e advogados trabalhistas. Por exemplo, se passar a livre negociação, que é um avanço modernizante, eles perdem poder (juízes e MPT) ou dinheiro (advogados trabalhistas).
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